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“Precisamos de histórias de LGBTa mais felizes”, diz autora de Heartstopper

Com uma rápida olhada na lista dos livros mais vendidos do país, é possível constatar que obras com protagonismo LGBTQIA+ viraram líderes de venda depois que Marcelo Crivella, ex-prefeito do Rio de Janeiro, tentou cobrir com sacos pretos, na Bienal do Livro de 2019, uma revista em quadrinhos da Marvel que trazia uma ilustração de dois rapazes se beijando.

Embora a tentativa de censura tenha tido efeito rebote, o cenário ainda é desfavorável. É o que diz Alice Oseman, inglesa de 27 anos que se tornou a autora infantojuvenil mais vendida deste ano no Brasil até agora depois que seus quadrinhos, “Heartstopper”, viraram série pela Netflix.

Oseman, que vai participar de um encontro virtual com seus leitores na Bienal do Livro de São Paulo, afirma que, embora a literatura juvenil tenha se tornado um bastião da representatividade LGBTQIA+, abastecendo o cinema e o streaming, falta diversidade.

“Quase não temos romances LGBTs interseccionais, com personagens negros ou com deficiência, por exemplo. Também temos muito menos personagens lésbicas, bissexuais e transgênero do que gays. Assexuais, então, quase nunca vi”, diz a escritora, ela própria arromântica e assexual, isto é, com pouca ou nenhuma atração, romântica ou sexual, por qualquer pessoa.

“É uma falha tão grande que eu mesma tenho uma personagem -Tori, irmã do meu protagonista- que só descobri que era assexual quando reli meus livros. Eu não sabia que ela era assexual porque não sabia nem o que significava ser assexual quando a escrevi, embora esteja claro na história”, acrescenta Oseman, prometendo visibilidade à assexualidade da personagem nas próximas duas temporadas de “Heartstopper”, ainda sem previsão de estreia, cujos roteiros são escritos por ela própria.

A autora diz ainda que, mesmo nas histórias protagonizadas por homens gays, não só as mais comuns como também as únicas que ganharam adaptações audiovisuais até agora, alguns conflitos comuns entre a comunidade não são retratados, caso dos distúrbios alimentares.
“Há muitas histórias de meninas com anorexia, mas de meninos quase nunca vejo. As pessoas acreditam que esses distúrbios só afetam as mulheres, mas eles também são um problema grave entre homens gays”, diz Oseman.

Sua visão é amparada por uma pesquisa da Attitude, revista gay britânica, cuja maior parte dos leitores -84%- dizem sentir pressão exagerada para ter um corpo perfeito.

Esse conflito já atravessa a primeira temporada de “Heartstopper”. Não está nos diálogos, mas é visível nas muitas cenas em que o protagonista recusa comida. Isso ficará mais claro, contudo, nas próximas temporadas, diz Oseman, assim como ocorre na série literária, cujo quarto volume, “Heartstopper: De Mãos Dadas”, chega às livrarias agora.

A abordagem da anorexia, no entanto, será feita por meio “de uma lente otimista e esperançosa”, diz Oseman, como já ocorreu na primeira temporada com assuntos tão densos quanto, como homofobia.

É este, afinal, o maior trunfo de “Heartstopper”, que consegue encontrar originalidade mesmo amontoando clichês de romances simplesmente por abordar a paixão entre dois estudantes que acabam de ingressar no ensino médio e estão descobrindo sua sexualidade por uma paleta ultracolorida, sem tragédias gregas, como de costume na ficção, que por muitas décadas associou a homossexualidade à catástrofe.

“Precisamos de histórias LGBTs mais felizes. ‘Heartstopper’ sempre será sobre a luz no fim do túnel. Neste caso, o foco é a superação da anorexia do protagonista”, diz Oseman.

“É difícil abordar estes temas, porque tenho que encontrar um equilíbrio entre o realismo sem deixar de lado o otimismo e a esperança que são meus fios condutores. O que me ajuda é pensar, como faço na minha própria vida, em como as coisas podem melhorar. É isso, afinal, que fez o público se apaixonar tanto pela história.”

Por Pedro Martins

SÃO PAULO,SP

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