O presidente do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), desembargador José Amilcar Machado, suspendeu a decisão liminar da Justiça Federal do Acre que havia determinado a inclusão de perguntas sobre orientação sexual e identidade de gênero nos questionários do Censo Demográfico 2022.
A medida gera alívio para o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que é responsável pelo Censo e havia ingressado com recurso contra a liminar.
A decisão do TRF-1 é de sexta-feira (24), mas foi divulgada pelo instituto nesta segunda (27).
Ao longo deste mês, o IBGE argumentou que não teria tempo hábil nem orçamento suficiente para fazer o acréscimo das perguntas de forma adequada no levantamento. O início da coleta das informações do Censo está previsto para 1º de agosto.
A Justiça Federal do Acre havia determinado no dia 3 de junho a inclusão das perguntas, após acolher pedido do MPF (Ministério Público Federal).
Pela decisão, o IBGE teria 30 dias para comunicar as providências tomadas para cumprir a medida.
O instituto, por outro lado, avaliou que o acréscimo poderia resultar em um novo adiamento do Censo, o terceiro consecutivo. A pesquisa já foi cancelada em 2020 e 2021.
Na avaliação do IBGE, a inclusão das perguntas geraria “impacto econômico severo”, aumentando os custos do Censo além do seu orçamento, estimado em R$ 2,3 bilhões.
O órgão também já afirmou que, em razão da metodologia, o Censo “não é a pesquisa adequada para sondagem ou investigação de identidade de gênero e orientação sexual”.
“A metodologia de captação das informações do Censo permite que um morador possa responder por ele e pelos demais residentes do domicílio”, disse o IBGE em março.
“Pelo caráter sensível e privado da informação, as perguntas sobre a orientação sexual de um determinado morador só podem ser respondidas por ele mesmo”, completou na ocasião.
Nesta segunda, o IBGE relatou em nota que “só vai se manifestar sobre a suspensão da liminar da Justiça Federal do Acre depois que a AGU [Advocacia-Geral da União] tiver sido intimada e examinado a decisão”.
Para o presidente do TRF-1, José Amilcar Machado, “ficou demonstrada” a impossibilidade de implementação das perguntas no Censo até agosto.
“A presente decisão está adstrita a aspectos gerenciais e temporais, uma vez que o início do Censo está às portas, e sua não ocorrência, como assinalado, acarretaria mais males do que benefícios à população”, escreveu o magistrado.
“No entanto, nada obsta, ou melhor, é imprescindível que, com um planejamento prévio, essas perguntas sejam inseridas nos Censos dos anos vindouros, ou mesmo em análises e prospecções específicas sobre o tema”, completou.
Responsável por pedir a inclusão dos campos sobre orientação sexual e identidade de gênero nos questionários, o MPF avaliou neste mês que as informações seriam importantes para subsidiar políticas públicas mais eficientes com foco na população LGBTQIA+.
Segundo a decisão de Machado, do TRF-1, “a coleta de dados com informações obtidas sem o respectivo respaldo técnico metodológico” poderia gerar “política pública inconsistente ou até mesmo equivocada para a população LGBTQIA+”.
O IBGE já relatou que esses quesitos estão previstos nas análises de outras pesquisas realizadas pela instituição.
Após o início da polêmica, o órgão divulgou em maio um levantamento inédito sobre orientação sexual.
De acordo com esse estudo, 94,8% das pessoas de 18 anos ou mais no país se declaram heterossexuais. Entre os entrevistados, 1,8% se disse homossexual (1,13%) ou bissexual (0,69%).
A pesquisa, porém, foi vista por especialistas como frágil por ignorar a sexualidade de pessoas transgênero e promover um reforço simbólico da heterossexualidade como padrão.
IMPORTÂNCIA DO CENSO
O Censo costuma ser feito a cada dez anos. Inicialmente, a nova edição estava prevista para 2020, mas não foi realizada devido à pandemia de coronavírus, que provocou restrições ao deslocamento de pessoas.
Em 2021, o que acabou inviabilizando novamente o estudo foi o corte de recursos destinados por parte do governo federal. A verba para 2022 foi liberada após o STF (Supremo Tribunal Federal) ser acionado.
Na prática, os dados apurados funcionam como base para uma série de políticas públicas e decisões de investimento de empresas. As informações balizam, por exemplo, os repasses do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), fonte de recursos para as prefeituras.
POR LEONARDO VIECELI
RIO DE JANEIRO, RJ
Foto de capa: Folha Press