Por Juliana Salles, voluntária da Biblioteca Comunitária Caio Fernando Abreu.
Ao compreender a relação entre as lutas e as mudanças que impulsionam, no aqui e agora, o florescimento das vidas, bem como a importância de se pensar as interseccionalidades, o Centro Cultural da Casa 1, do qual a Biblioteca Comunitária Caio Fernando Abreu faz parte, realiza também ações voltadas a crianças e adolescentes. Apresenta-se, assim, como um referencial acolhedor e como dispositivo de acesso a direitos para este público que se faz visto de diferentes modos no Bela Vista, inventando e ocupando espaços livres e comunitários.
Em meio à pandemia de COVID-19 e com o longo período de suspensão das atividades de creches e escolas, crianças e adolescentes não pararam de buscar a Biblioteca, que se manteve em funcionamento restrito, com atendimento da porta para fora. Nesse período, se destacou ainda mais a ação de distribuição gratuita de kits de literatura, compostos por livros, materiais de escrita, de desenho e/ou brinquedos. Com a volta às aulas presenciais na rede pública, outros materiais escolares foram angariados através de campanha específica, somando-se itens como massa de modelar, tinta guache, cadernos e agendas, tesouras sem ponta, giz, dentre outros.
Os livros chegam à Biblioteca por meio de doações e são recebidos por equipe que realiza a triagem de modo a assegurar o compartilhamento dos que estão em bom estado. A equipe articula-se também para separá-los considerando diferentes faixas etárias. Desta forma, desde 2021, foram distribuídos mais de 1284 kits, dentro do projeto mais abrangente chamado “Balaio Literário”.
Diariamente, cada criança ou adolescente pode pegar um kit e, assim, aquelas e aqueles que moram perto, voltam dia após outro, multiplicando histórias e vivências literárias. Conversam com o pessoal do atendimento em busca dos mundos legados pelas páginas. Elas e eles realizam no território o potencial transformador de uma biblioteca: as calçadas ganham seus desenhos e a presença de uma menina, sentada numa soleira ou em algum degrau da rua Condessa de São Joaquim, desponta na paisagem de um centro movimentado, modificando o fluxo com a sua pausa investigadora e um livro entre em mãos – enquanto cultiva suas palavras próprias, abre outras imagens da cidade às/aos transeuntes.
Ao democratizar a literatura, tornar a prática de leitura acessível, e fortalecer o vínculo com esses importantes frequentadores, a Biblioteca Comunitária Caio Fernando Abreu compõe com essa comunidade de desejo, em que a experiência literária e o gosto pelos livros podem lampejar desde cedo quando há breu na cidade.
Foto de capa: Rua Condessa de São Joaquim, Bela Vista. Fotografia de Átila Augusto Morand.